sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Vedas ou Hindu?
 (Texto baseado em uma conferência proferida por Srila Prabhupada na Inglaterra, nos anos 70)

Na epistemologia védica, pratyaksa, literalmente empirismo,  é o caminho para se  adquirir conhecimento mediante os sentidos materiais.  Ainda segundo  os Vedas, que significa Conhecimento Original Revelado,   a entidade viva, em seu estado condicionado ao mundo material, está sujeita à muitas deficiências.  O que diferencia uma alma condicionada de uma alma liberada é que a alma condicionada tem quatro tipos de defeitos.   O primeiro defeito é que ela não pode deixar de cometer erros.   Todos podem facilmente compreender essa dificuldade.  Errar é humano, preconiza um provérbio popular praticamente conhecido no mundo inteiro.

Outro defeito é iludir-se.  Ilusão quer dizer aceitar algo que não é; maya.  Maya significa aquilo que não é; ilusão, ou seja, energia do Supremo que deixa a entidade viva esquecida de sua verdadeira natureza espiritual.  Todos estão aceitando o seu corpo como o eu.  Se alguém lhe pergunta quem é você, você dirá:  “Eu sou o João; eu sou  médico;  eu sou brasileiro;   eu sou um homem rico; eu sou isto, eu sou aquilo.”  Tudo isto são identificações corpóreas, mas a pessoa verdadeira não é este corpo.  Isto é ilusão, ou conhecimento empírico da sua própria constituição.

O terceiro defeito é a propensão para enganar.  Todos estão propensos a enganar os outros.  Embora esteja em ilusão e cometa erros, como já foi evidenciado, uma pessoa faz pose de muito inteligente e ainda, na base da “achologia”, teoriza: “Eu acho que isto é assim,  e isto é isto.” Mas ela nem mesmo conhece a sua própria posição constitucional.  Escreve livros,  fala de filosofia e funda movimentos religiosos para o seu próprio prazer, sua própria gratificação dos sentidos, apesar de serem defeituosos.   Esta é a sua doença. Isto é enganar. 

Finalmente, as entidades vivas têm sentidos imperfeitos.  Orgulham-se de seus olhos, por exemplo.  Mas se uma sala escurece, não conseguirão sequer ver as suas próprias mãos.   Então, qual é o seu poder de visão?  Não se pode, portanto esperar conhecimento (veda) com esses sentidos imperfeitos.  Com todas essas deficiências na vida condicionada, não se pode dar conhecimento perfeito a ninguém.

Na Índia os princípios védicos são plenamente aceitos pelos panditas (sábios), pelos sadhus (pessoas santas)  e pelos  religiosos e estudiosos em geral.  Por não conterem erros, os princípios védicos são aceitos como verdades axiomáticas.

Por exemplo, há uma injunção védica que preconiza a necessidade de se tomar banho imediatamente,  caso se toque em excremento. Por outro lado, os indianos aceitam que o estrume de vaca é puro. Se alguém passar estrume de vaca em um lugar impuro, este tornar-se-á puro. À luz de uma compreensão ordinária isso é contraditório, mas é absolutamente verdadeiro.    Analisando o estrume de vacas, eminentes e céticos cientistas de Calcutá descobriram que ele contém inúmeras propriedades anticépticas.
 
As escrituras védicas são de amplo escopo.  Só o Rig Veda contém 1017 hinos, o Mahabharata, no qual está incluído o famoso Bhagavad-Gita, consiste em 110.000 dísticos e os dezoito Puranas principais são compostos por centenas de milhares de versos.  Há ainda os 108 Upanishads, os quatro Vedas Originais, O Pancharatra, o Ramayana, os Itihasas, etc.

A literatura védica não é morta nem arcaica.  No entanto qualquer literatura — seja ela moderna ou antiga —  é considerada não-védica se ela se devia do siddhanta védico (conclusão harmoniosa). Assim, o budismo, o jainismo e o sikismo, embora sejam ramificações da literatura védica, não são considerados védicos.

O conceito de hinduísmo, principalmente,  é alheio a conclusão védica. Chamar os indianos de hindus e os vedas de hinduísmo, não passa de uma abordagem empírica da milenar sabedoria da Índia. Assim, também,  criou-se a “trindade hindu” de Brahma-Shiva-Vishnu.  O termo trindade sugere uma tentativa de aplicar a teologia cristã às escrituras védicas reveladas.

As palavras “hindu” e “hinduísmo” não são encontráveis em nenhuma parte da imensa e mais antiga literatura que o gênero humano tem conhecimento, a literatura védica revelada.    Ainslee T. Embree,  historiador inglês, escreveu à página 8 de seu  “The Hindu Tradition”:  “O cenário físico é a terra que, desde épocas passadas, o mundo ocidental conhece como sendo Índia, uma palavra que os gregos tomaram emprestada dos persas, que, por causa da dificuldade que tinham com o ‘s’ inicial, chamavam o grande rio Sindhu (o atual Indo) de Hindu.  Foi com esta palavra que os estrangeiros passaram a designar a religião e a cultura dos povos que viviam na terra banhada pelos dois rios, o Indo e o Ganges, embora os próprios nativos jamais usassem  tal  termo”.

Assim, hindu e hinduísmo passaram a ser amplamente usados, e quase todos os dicionários definem Vishnu como o “deus hindu”, embora nenhum acharya (mestre) ou as escrituras jamais tenham usado essa expressão. “Religião Hindu” é também o nome  hoje utilizado para descrever todas as espécies de atividades sociais, culturais, religiosas e nacionalistas, muitas das quais não são sequer védicas.

Para denotar uma sociedade védica genuína os shastras (escrituras) usam a palavra sânscrita ariana.  Para os seguidores dos Vedas, o avanço humano significa avançar rumo à compreensão espiritual, e uma comunidade com objetivos espirituais era designada de comunidade ariana.  A instituição social ariana ficou conhecida como varnasrama-dharma que agrupa a sociedade em quatro ordens sociais e em quatro ordens religiosas. As famosas quatro castas indianas são, portanto, uma forma deturpada das quatro ordens sociais védicas, que não são hereditárias como àquelas.

Portanto, para concluir este texto, não se pode interpretar as injunções védicas de forma empírica usando os nossos sentidos imperfeitos, pratyaksa, sob pena de nos transformar em “hinduístas”, ou seja, estudantes de "hinduísmo", ou aquilo que simplesmente não existe.  A propósito, quem nasce na Índia não é hindu; é indiano.  

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